sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Ciclos

O pedalar, um ciclo de vai e vem
que apenas
vai
   vão
      vamos
Magia fazemos
com as vindas e chegadas.

Nas idas e partidas, apenas lágrimas
escondidas atrás de um até logo.
A caminhada interrompida não é desistência.
Às vezes precisamos descer
antes do ponto final.

Nesses trajetos aprendemos sequências várias
e até criamos e/ou adaptamos outras tantas.
Percorrer tantas estradas que pensamos conhecer
para mascarar a ignorância diante de si próprio.
Após mapear-nos saberemos quais  monstros nos habitam.
E quais perigos são reais.

A caminhada não é tranquila nem harmônica.
Entediante, só as paradas, a espera.
Seguir a passos lentos.
Correr.

Em ciclos que apenas vão

Deisi Perin
Ocupação Nova Primavera - Curitiba

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Anímico animal



Petrificado pelas sensações.
Um bicho. Transmuta
Dor de si. Calcário,
Prende no rosto da rocha
Um reino de pesar. Pensa
Sob seu magma, sente
A poeira nas formas:
Sedimentária magia.
Requenta um passado
De fome. Um nome
Sublima a meninice do homem.
O anímico animal crava os dentes
No sangue da rosa. O peito
Como o diabo gosta:
Santa candeia de artérias.
Um servo: de querer bem ao corpo;
Um passo: rumo a tudo que varre;
Um sopro: de abismo e de glória.
Poente, um deus que venta o rio.
Senhor de fogo, de frio,
Ferve o eterno.
Verve do querer.

Roberta Tostes Daniel


(2010)

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Lava

E, pensei, se têm razão
tanto Heráclito e Parmênides
e lado a lado existam dois mundos,
um tranquilo, outro louco, uma flecha
zune sem reflexão e outra a observa
tolerante: a mesma onda flui e não flui,
os animais nascem e morrem ao mesmo tempo
folhas de bétulas brincam com o vento e, por sua vez,
fenecem na chama ferruginosa e cruel.
A lava mata e perpetua, o coração golpeia
e é golpeado, houve guerra, não houve guerra,
judeus morreram, judeus vivem, cidades arderam,
cidades estão de pé, o amor empalidece o beijo eterno
marrons hão de ser as duas asas do falcão,
você segue comigo, embora já não estejamos,
os navios naufragam, areias cantam e nuvens
vagabundeiam como pedaços de véus nupciais.

Tudo está perdido. Tanta alucinação. As colinas
cautelosamente carregam longas bandeiras do bosque
o bolor sobe a torre de pedra da igreja
e elogia, com seus lábios timidos, o norte.
Ao crepúsculo, jasmins como lâmpadas ferozes
brilham atordoados com seu próprio resplendor.
No museu estreitam-se ante a lona escura
pupilas felinas de alguém. Está consumado.
Cavaleiros galopam seus negros corcéis, o tirano escreve
uma sentença de morte repleta de erros.
A juventude torna-se nada no transcorrer
de um só dia, o rosto das moças torna-se
medalhões, desespero torna-se encanto
os frutos das estrelas crescem no céu
como uvas, a beleza dura, trêmula e impassível,
Deus está e morre, a noite regressa ao nosso lado
a cada entardecer, e é, o arrebol, madreperolado pelo orvalho.


Adam Zagajewski/traduzido da versão em espanhol de Elzbieta Bortkiewic por Ricardo Pozzo

domingo, 16 de fevereiro de 2014

O Contestado é agora!

Natal na ocupação Nova Primavera/ 2013

DNA psicodélico

A dupla hélice
colorida,
arredondada
icônica estrutura
helicoidal

que sobe e desce
pré-determinando
cores e formas
dons e sabedoria
medos e traumas
alma e psique.

Quem sou?
Como sou?

Vida, continuidade
e essência
contida numa complexidade
e singeleza
tão linda
tão colorida

tão dolorida.

Num tempo rumo
ao igual
ao conforme
à padronização

alegra-me saber
que,ao menos,
por dentro
sou um DNA psicodélico


Deisi Perin

sábado, 15 de fevereiro de 2014

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Submundos em nós



Não conhecia as cores
Vivia num lugar que semeava a escuridão
Era levado por vozes entrecortadas
Sombras dançantes de árvores fossilizadas

Eu descia dos longos troncos das sequoias do norte
E tentava segui-lo de longe, tão longe quanto
estamos agora de nossos pais
Era uma batalha encontrá-lo naquele lugar
Eu gritava pelo seu nome que ecoava em submundos divididos por escolhas

Eu tinha medo das pessoas que pensavam em suicídio e atravessava a rua ao pressenti-las aproximando-se com seu ponto final cravado na pupila

Um dia, finalmente o encontrei e foi a última vez
que nos vimos
Ele havia se tornado um pássaro estranho e o seu
espírito não reconhecia mais com o meu

Separamos as nossas solidões e eu voltei para
as sequoias que sabiam me presentear com todas as cores do sol.

Alexandra Barcellos

É POESIA - BATISTA DE PILAR - CARRO PAPEL HOMEM

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014


Alguns Livros Depois



como se você chamasse,

chamasse, chamasse

todos eles viessem como labaredas

desfiguradas

palavras que como sulcos

percorrem a precisão dos traços -

depois o vento os levanta

na maresia carbonizada, sementes eriçadas

pelo vento, viés:

a elucubração de poema que nasce desse ancoradouro

terra que lavra; o terceiro dia, insurreto

a voz cavando em páginas de um delírio putrefato,

carne para só a carne responder à solidão


arrepio de singrar um nome.


Roberta Tostes Daniel

domingo, 2 de fevereiro de 2014


Sai correndo o som da  sirene a saltar muros
percorrendo grades .

Hora dos mistérios no prato do preso
a premeditar sombras de uma corda só.

Cordas que prendem uma mãe ao filho
que germinou naquela criança abreviada.

O buraco no muro escoa mais uma sombra
nas telas da cidade.


Wilson Roberto Nogueira